angeli decreta o fim de uma era, estreia uma loja virtual, alguns filmes e trabalha numa revista digital em parceria com laerte
os ventos da mudança batem na janela do estúdio de angeli.
aos 60, resolve dar outra guinada na vida e experimentar novas mídias e possibilidades.
a partir desta sexta, 31, entra no ar sua loja virtual com desenhos digitalizados pinçados dos milhares que já produziu.
em vários formatos, papel nobre, assinados e numerados, há para todos os gostos: de personagens clássicos como bob cuspe a esboços, cartuns ou charges.
para ver, é só acessar https://www.angelimatador.com/
chargista político há mais de 40 anos, editor, cartunista, ilustrador, cronista, angeli testa novos formatos e colhe os frutos de uma carreira brilhante.
com 17 prêmios hqmix consecutivos de melhor chargista, vários livros e comendas, vê seus personagens viverem agora em filmes e animações stop motions.
além disso trabalha no projeto baiacu em parceria com laerte, rafa coutinho e andré conti, ex-companhia das letras.
abaixo, entrevista com o cartunista assassino:
blogdoorlando – como vc vê o panorama da charge hoje no brasil? ainda funciona?
Angeli – Pelo que tenho acompanhado, acho que a charge está perdendo um lado de reflexão, de peso, de crítica mais ácida, para se tornar algo mais casual que provoque risadas e nada mais. Não sei se funciona. Mas também não sei se um dia funcionou.
blogdoorlando – me lembro de uma entrevista lá pelo final dos 80/começo dos 90 em que vc falava que nunca mais voltaria a fazer charge em jornal. voltou e o fez brilhantemente. qual o balanço que vc faz desse período?
Angeli – Acho que voltei em um momento em que a política – nacional e internacional – estava fervendo e fiquei bastante empolgado em trabalhar e retratar aquela época, acredito que vi ali uma entrada que pudesse dar vazão a um lado mais sarcástico, mais forte do trabalho e fui burilando essa verve com o tempo. Isso culminou no livro "O Lixo da História" editado pela Cia. das Letras e que é um retrato das últimas guerras mundiais.
blogdoorlando – mais do que chargista vc é um tremendo desenhista. qual sua relação com as formas, traços e acabamento? o quanto isso ocupa de tempo e cuidado no seu trabalho?
Angeli – Essa relação com as formas e o acabamento é árdua. A ideia de que o próximo desenho seja melhor que o anterior é incansável e na maioria das vezes obsessiva. A busca por referências e técnicas é infinita e a minha tentativa é de explorar o que aparecer na frente. Nem sempre dá certo. O traço foi mudando ao longo dos anos, claro. Fui abandonando os personagens narigudos, tentando fugir da forma mais simples do desenho, das piadas mais fáceis. Me debrucei em referências como Goya, Bruegel e trouxe isto para a charge diária. Ao longo dos anos, fui carregando cada vez mais nos detalhes, pesando a mão nas minúcias. Talvez a contundência gráfica e de discurso tenham se aprimorado também por isso. Sempre gostei de ficar muito tempo em cima de um trabalho. A tentativa é de não fazer as coisas de maneira rápida, mesmo trabalhando para uma publicação diária, exploro até cair a última gota de sangue.
blogdoorlando – longe das redes sociais, vc está inaugurando uma página com loja, blog, link para o site e tudo o que tem direito. como vc está se sentindo com essa nova possibilidade?
Angeli – Eu vejo como uma ferramenta bacana de divulgação de tudo o que eu já fiz. As mídias existem. Estão aí. O mundo usa… Mas, acredite, vou continuar recluso.
blogdoorlando – seu trabalho sempre foi público. a internet te assusta?
Angeli – Não assusta. Tive colunas ilustradas especialmente para internet. Meu trabalho está lá. Eu só não entro no "fervilhão" nem na pressa que ela pede. E não respondo a ninguém.
blogdoorlando – e tem o filme que está na boca do gol. como rolou isso?
Angeli – Tem a série feita em stopmotion, "Angeli The Killer", que estreia agora em Abril no Canal Brasil. Foi produzida e dirigida pelo Cesar Cabral da Coala Filmes. Eles fizeram o curta metragem "Dossiê Rê Bordosa" e quiseram continuar na mesma pegada com a série e com o longa "Bob Cuspe, nós não gostamos de gente" que deve estrear em 2018. Topei de imediato.
blogdoorlando – vc participou do processo?
Angeli – Participei de longe. Dei muitas entrevistas porque a série é um documentário fictício. Dei uns pitacos em relação ao roteiro para não fugir muito do trabalho original mas a obra é uma livre adaptação. Escolhi junto com eles as vozes dos personagens: Odayr Baptista e Regina Bittar fazem os locutores que carregam as histórias; Alessandra Negrini faz uma participação especial como Mara Tara; André Abujamra é a voz do Rhalah Rikota; Arthur Kohl e Wando Doratiotto são Wood&Stock; Grace Gianoukas é a Rê Bordosa; Hugo Possolo dubla os Skrotinhos; Milhem Cortaz, o Bob Cuspe; Paulo Cesar Peréio é o Bibelô; Carolina Guaycuru é ela mesma em participação breve e Reinaldo Rodrigues e Veridiana Benassi fazem as vozes dos coadjuvantes.
Não vi resultado final ainda mas estou curioso.
blogdoorlando – angeli sempre foi um artista da mídia impressa. como vc vê essa agonia pela qual ela passa?
Angeli – O fim de uma era.
blogdoorlando – vc ainda vê espaços para vc nela?
Angeli – Acho difícil continuar a fazer o mesmo trabalho dos últimos 40 anos. Laerte, Rafa Coutinho, André Conti e eu estamos levantando o projeto Baiacu, que transita entre as mídias digitais e impressas com uma interação real entre artistas, passeando pelas gerações passadas e novas. Essa é minha aposta para o futuro.
blogdoorlando – me fala do angeli daqui 10 anos.
Angeli – O fim está próximo.
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