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futebol, o ópio dos cartolas

Orlando

19/03/2013 08h00

nelson rodrigues, autor de  um sem número de crônicas sobre futebol, deve estar rolando no caixão.
em vários de seus textos ele fala dos 90 mil, 100 mil espectadores (pagantes!) do maracanã e do espetáculo que era a casa lotada.
choraria ao ver o minguado público que faz de nossos estádios, arquibancadas de circo mambembe.
se vc é daqueles que assiste aos jogos de casa, já percebeu que as câmeras têm que fechar seu foco no gramado. o cenário em frente a elas é de uma tristeza sem fim. fileiras e fileiras de cadeiras vazias ou com meia dúzia de gatos pingados.
se for um jogo desses maomeno, a concentração das torcidas acontece atrás dos gols, a parte menos nobre do estádio.
só pra ficar no campeonato paulista, são paulo x palmeiras tiveram míseros 18 mil torcedores, santos x corinthians, 17 mil na semana passada. neste fim de semana, são paulo x oeste  e palmeiras x s. caetano fizeram com que 7.800 e 2.300 pagantes, respectivamente, encarassem a tarde chuvosa de domingo para assistir aos jogos.
se o futebol foi um dia o ópio do povo, provavelmente hoje, ele seja o ópio dos cartolas.
o que pode fazer alguém gostar de estádios vazios?
é algo inexplicável.
às vésperas de olimpíada e copa do mundo, os espaços de competição eram e, ainda são em grande parte, de uma indigência vergonhosa. desconfortáveis, penam com acesso difícil ao transporte público, poucas vagas de estacionamento, flanelinhas, ambulantes de toda a ordem, pouca segurança e, pior, pouco futebol.
qual é o mané que vai pagar $80 (oitenta!) a testa pra ver se um palmeiras x s. caetano vai ser bom? quem é que vai sair de casa, pagar um ingresso caro, encarar uma maratona prum jogo que vai começar às 22h (por causa da novela), depender de uma condução capenga e ainda ir trabalhar no dia seguinte?

existiam dois programas pra duros: ir ao cinema e ir ao estádio.
com algo como 5 reais vc assistia um filme ou ia se pendurar no tobogã do pacaembu. e se divertia às fartas.
hoje, ir ao cinema virou uma guerra. filas, shopping, salas pequenas. o estádio, virou programa pra bacana ou solitários.
ingressos a $40 ou mais, multiplicados por filhos, sobrinhos ou agregados, tornaram o programa impraticável para a maioria das famílias.
a pátria de chuteiras, frase do mesmo nelson rodrigues, se distancia das arquibancadas, de seus times, de seus ídolos.
estádios lotados (e olha que nem sempre) só nos grandes shows de rock a 400 pilas com mauricinhos e patricinhas fotografando e twittando sem se importarem com o que acontece no palco.
algumas das arenas, aliás, pensam em amenizar seus investimento abrigando shows e festivais de música.

futebol que é bom, ficou pra trás. nem ópio, nem remédio, nem alienação, nem divertimento.
virou uma coisinha assim, assunto de infinitas mesas redondas na televisão e espaço nas páginas de jornal.
daqui a pouco, talvez, nem isso.

Sobre o autor

Orlando Pedroso é artista gráfico e ilustrador, trabalhou com praticamente todas as publicações da grande imprensa. Foi colaborador da Folha de S. Paulo de 1985 a 2011. Ilustrou mais de 60 livros infanto-juvenis e é co-autor de “Livro dos Segundos Socorros” e “Não Vou Dormir” – finalista do prêmio Jabuti de 2007 nas categorias “ilustração” e “melhor livro”. Foi vencedor do Prêmio HQ Mix de melhor ilustrador nos anos de 2001, 2005 e 2006. Expôs nas mostras individuais como “Como o Diabo Gosta”(1997) , “Olha o Passarinho!”(2001), “Uns Desenhos” e “Ôtros Desenhos” (2007). Em 2008, faz uma exposição retrospectiva de 30 anos de trabalho como artista convidado do 35º Salão de Humor de Piracicaba.- É autor dos livros Moças Finas, Árvres e do infantil Vida Simples, e membro do conselho da SIB – Sociedade dos Ilustradores do Brasil.

Sobre o blog

Este blog trata de artes gráficas, ilustração, cartum, quadrinhos e assuntos aleatórios.

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