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tem caipirinha no festival de quadrinhos de angoulême

Orlando

31/01/2013 08h00

começa hoje, dia 31, na cidade de angoulême, na frança, o maior e mais prestigiado evento de quadrinhos da europa.
realizado desde 1974, traz neste ano 1.600 autores, 15 exposições, 300 encontros, palestras e oficinas, 110 espetáculos e projeções, trabalhos de artistas de 36 nacionalidades além de, claro, proporcionar um saudável intercâmbio entre artistas e editoras do mundo todo.
a frança é conhecida por seu reconhecimento, respeito e grande consumo de quadrinhos.

entre os brasileiros convidados estão fábio moon e gabriel bá que, além de divulgarem daytripper e casanova, farão palestra sobre seu trabalho na sexta-feira.
rafael coutinho lança seu cachalote versão francesa e andré diniz, seu morro da favela. ambos falarão nesta tarde sobre hq no brasil hoje.
julia bax e amanda grazini divulgarão sua hq pink daiquiri que foi escrita pela dupla francesa laurent habart e mélanie théry.
no bonde ainda seguem os jovens quadrinistas davi calil e amilcar pina.

abaixo, entrevista com fábio, gabriel e com andré diniz, que mandou suas respostas já da frança:

blogdoorlando – angoulême continua sendo um dos mais importantes festivais de quadrinhos da europa.
qual a importância de vc participar dele?
Gabriel – A gente já participou de festivais em Portugal, Londres e Itália, mas sempre como autores que publicam nos Estados Unidos, pois o mercado americano é muito forte frente aos mercados locais destes países. Mesmo sendo Brasileiros, é o que a gente publica nos EUA que atravessou os oceanos. Mas na França é diferente, o mercado de lá é gigante. É difícil de explicar a diferença, pois os livros que publicamos lá – Daytripper e Casanova – foram publicados nos Estados Unidos primeiro, mas estão funcionando como nossa entrada no mercado francês. É como se não existíssemos antes destes livros e, de repente, já entramos com tudo.
Mas acho que o fato de sermos do Brasil e de contarmos histórias que se passam no Brasil, mas sem estereótipos, sempre nos destacou, já aqui mesmo no Brasil, assim como fez nos EUA e como está fazendo na França. O trabalho acaba sobrevivendo às barreiras dos mercados e funciona sozinho, em qualquer língua. Nós acabamos criando no olhar estrangeiro a curiosidade sobre o mercado de Quadrinhos Brasileiro, sobre outros autores, outras publicações. Poder fazer isso em um festival grande como o de Angoulême é emocionante.
Fábio – Acho que Angoulême é a maior janela para o mundo dos Quadrinhos na Europa, então acho incrível estar lá para poder ser descoberto por todo mundo que vai olhar a paisagem pela janela. Agora, essa paisagem é imensa, então você precisa tentar chamar atenção, e acho que a junção do livro publicado e a presença do autor ajuda a aumentar a visibilidade do nosso trabalho. Fui para um festival na França em Outubro passado, chamado Quai des Bulles, que acontece todo ano em Saint Malo. Dizem que é o segundo maior da França. Lá, tive uma impressão forte de uma afinidade com muito do que está sendo publicado na França, com os artistas, com os estilos. Acho que existe uma semelhança um pouco desconhecida entre o mercado brasileiro e o francês e quero explorar mais essa conexão e ver no que dá.
André – Esse é um momento muito significativo para mim, pois foi no ano passado que rompi as barreiras do Brasil. Era um sonho antigo estar em Angoulême, e é mais fantástico ainda quando essa primeira vez se dá já com um título para autografar e já com uns amigos europeus a encontrar.

blogdoorlando – rolou um convite ou vc está indo por iniciativa própria?
Fábio – Sempre quisemos ir a Angoulême, ouvimos falar muito, mas não queríamos ir na raça, sem conhecer ninguém, sem nada publicado. Eu não queria ir somente como amante de Quadrinhos, como fã. Já começamos do zero aqui no Brasil e já desbravamos o mercado americano com muito esforço. Estávamos esperando o momento certo pra ir a Angoulême: com livro publicado, convidados pelo festival ou pela editora. Rolou.
Gabriel – O Fábio e eu fomos convidados em Agosto pela nossa editora, Urban Comics, um braço da Dargaud, pra participar do evento, pois o Daytripper está vendendo bem e os editores acharam que nossa presença seria boa pro livro. No final de Novembro, saiu a lista oficial do prêmio de Angoulême e o Daytripper foi selecionado, aí a editora confirmou o convite e tomou conta de todos os preparativos pra nossa viagem.
André – Eu já tinha decidido ir por conta própria, daí a partir de então rolaram os convites para a sessão de autógrafos e para a palestra.

blogdoorlando – que material vc está levando e qual sua expectativa com relação a ele?
Gabriel – Com a boa repercussão do Daytripper, é preciso aproveitar o momento para mostrar aos editores de lá coisas que já fizemos, coisas que estamos fazendo, novos projetos. Temos quatro histórias nossas pra mostrar pra editores de lá: "O Alienista", nossa adaptação do conto do Machado de Assis; "Meu Coração, Não Sei Por Quê.", nossa segunda história dos 10 Pãezinhos, que já ganhou uma edição americana e uma italiana, renomeadas de "URSULA"; e um trecho da nossa adaptação do "Dois Irmãos", romance do Milton Hatoum, que estamos fazendo pra Companhia das Letras. Além disso, estamos levando nosso livro "cidades ilustradas" São Luís".
Fábio – Acho que tenho uma espectativa grande em relação ao "Dois Irmãos", que será nosso próximo grande lançamento depois do Daytripper e, como tal, sacia a pergunta que todos os editores nos fazem: "Qual é seu próximo projeto depois do Daytripper". Na verdade, não espero que o trecho que estamos levando sacie, mas sim que aumente a curiosidade pelo projeto.
André – Estou levando alguns projetos para apresentar a outras editoras, mas não tenho a menor ideia de como vai ser isso na prática!

blogdoorlando – há algum artista em especial que vc espera ter contato?
e com relação às editoras?
Gabriel – Quero conhecer o Uderzo, o Bastien Vivés, rever o Cyril Pedrosa e o Frederik Peteers. Quanto às editoras, rever os editores que eu já conheço e conhecer novos, pois existem muitas editoras, com diferentes perfis de publicação. É um mundo completamente novo.
Fábio – Quero descobrir o perfil das editoras, saber quais publicam mais material adulto, quais são focadas mais no público infantil (que, assim como no Brasil, é o grande público, o público dos clássicos), como essa dinâmica funciona. Os autores e seus livros são as melhores surpresas de todo festival. Quero rever os amigos internacionais e fazer novos, descobrir quadrinhos que nunca chegam por aqui. O Cyril Pedrosa e um grupo de amigos artistas se juntaram para criar uma revista virtual de Quadrinhos, publicada primeiro na internet. Quero trocar uma ideia com eles. O Mark Siegel, autor americano que é também editor da First Second (uma editora americana), é sempre uma ótima companhia para falar de quadrinhos pelo mundo e, encontrando com ele na França, acho que será ainda mais legal falar sobre todos os Quadrinhos que não vão para as convenções nos Estados Unidos mas que gostamos (e que são muito mais parecidos com os brasileiros).
André – Estou mirando mesmo é nas editoras…

blogdoorlando – apesar de os quadrinhos brasileiros estarem vivendo uma pequena bolha comercial, o que vc acha que falta para que quadrinistas possam viver de suas obras?
Gabriel – Uma remuneração satisfatória só vem com um volume maior de vendas. Ou os autores produzem mais e, aos poucos, com pequena vendas de muitos livros, ganham o suficiente; ou publicam em vários países, vários mercados, também acumulando no todo um montante que sustente sua vida, sua produção. Assim como o mercado literário, aqui no Brasil já começa a funcionar o esquema da editora dar um "adiantamento" para o autor produzir sua HQ. Longe de salvar vidas, mas é melhor do que nada. Quanto melhor são as vendas, melhor pode ser o adiantamento. E se o livro realmente vender bem, o autor ainda pode receber mais "royalties" depois que cobrir o adiantamento. Esse esquema existe nos mercados internacionais também e ele ajuda a manter os autores. Abrir portas nestes mercados, então, é uma maneira de tentar possibilitar uma produção constante, amparada por várias frentes.
André – Não acho que seja uma bolha, pois algumas mudanças decisivas foram feitas: mudou-se a forma do público, das livrarias, da mídia e das editoras verem os quadrinhos, sem falar que a qualidade do trabalho dos artistas brasileiros melhorou absurdamente nos últimos 10 anos. Mesmo que o mercado recue, acho que essas conquistas vieram para ficar. Mas pra viver só dos quadrinhos ainda é preciso rebolar muito. Não tem jeito, o mercado precisa crescer mais e atingir um público ainda maior.

blogdoorlando – que tipo de incentivo vc está recebendo para essa viagem e o que vc acha que deveria melhorar?
Gabriel – Bom, além da boa recepção do nosso livro na França, também recebemos uma ajuda da Biblioteca Nacional como parte de um programa pra divulgar a cultura Brasileira e promover a publicação da literatura brasileira no exterior. Eles inclusive têm um programa que ajuda as editoras estrangeiras a publicar material nacional. Fiquei bem feliz com essa iniciativa e espero que ela ainda ajude muitos outros autores.
Agora, como sempre, ninguém sabe que estamos indo para o maior festival de Quadrinhos da Europa. A grande mídia não valoriza a nossa presença lá, nossa participação. Acho que tudo voltou ao normal e a imprensa voltou a esquecer que os Quadrinhos existem. Isso é bem decepcionante, pois eu acho que o interesse pelos Quadrinhos não pode existir somente quando eles geram grandes notícias, como ganhar prêmios internacionais inéditos, mas cada pequeno passo deveria ser valorizado.
Fábio – Aproveitamos a ajuda da Biblioteca Nacional para comprar material e preparar os projetos de republicação dos nossos livros. Teríamos conversas muito mais informais, teóricas, sobre nossos livros que podem ser republicados por lá sem esse incentivo para preparar um bom material impresso que desse uma boa ideia do visual e do conteúdo das nossas histórias. A Companhia das Letras nos ajudou a preparar a prévia do "Dois Irmãos", livro que será publicado por ela aqui no Brasil, correndo atrás da tradução e da impressão desse material inédito.
Acho que podia existir uma conversa maior entre uma Biblioteca Nacional, por exemplo, e algum membro cultural francês, para que a oportunidade de mostrar o Quadrinho brasileiro fosse melhor aproveitada. O Rafa e o André farão uma palestra e só, nesse sentido. Acho que essa ajuda, com o tempo, pode ser pensada com mais calma, com maior antecedência, para que inclua visita a estúdio de outros artistas, troca de experiências, mais palestras, workshops, cursos. Para isso, os autores também precisariam se preparar com antecedência. Acho que essa seria uma melhora mais substancial para os artistas de ambos os mercados. Veja o que a editora francesa vai fazer conosco, por exemplo. Aproveitando nossa viagem para Angoulême, entraram em contato com livrarias especializadas pela França que, em conjunto com a editora, vão bancar uma semana a mais da nossa viagem para fazermos um pequeno tour de dedicatórias pela França. Depois de Angoulême, vamos para Le Mans, Nancy e Lyon, além de Paris, por incentivo da editora junto às livrarias, para aproveitar mais nossa viagem.
André – A Biblioteca Nacional ofereceu um valor que cobre a maior parte das despesas. Também está oferecendo apoio a editoras de fora que queiram traduzir títulos brasileiros, incluindo quadrinhos. Pra mim, já tá ótimo assim.

 

 

 

 

 

Sobre o autor

Orlando Pedroso é artista gráfico e ilustrador, trabalhou com praticamente todas as publicações da grande imprensa. Foi colaborador da Folha de S. Paulo de 1985 a 2011. Ilustrou mais de 60 livros infanto-juvenis e é co-autor de “Livro dos Segundos Socorros” e “Não Vou Dormir” – finalista do prêmio Jabuti de 2007 nas categorias “ilustração” e “melhor livro”. Foi vencedor do Prêmio HQ Mix de melhor ilustrador nos anos de 2001, 2005 e 2006. Expôs nas mostras individuais como “Como o Diabo Gosta”(1997) , “Olha o Passarinho!”(2001), “Uns Desenhos” e “Ôtros Desenhos” (2007). Em 2008, faz uma exposição retrospectiva de 30 anos de trabalho como artista convidado do 35º Salão de Humor de Piracicaba.- É autor dos livros Moças Finas, Árvres e do infantil Vida Simples, e membro do conselho da SIB – Sociedade dos Ilustradores do Brasil.

Sobre o blog

Este blog trata de artes gráficas, ilustração, cartum, quadrinhos e assuntos aleatórios.

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