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dia dos pais sem as filhas

Orlando

10/08/2015 12h38

como na música do caetano, eu achava que tinha nascido para ser o superbacana.
achava que poderia ver através das paredes, que poderia ficar forte comendo espinafre e que voar era questão de treino.
depois, achei que podia ser o melhor amigo, o melhor profissional, o melhor namorado, o melhor marido, o melhor pai.
até que um dia eu percebi que todo mundo tinha o melhor pai do mundo e que a concorrência era braba. e muitas vezes desleal.
tinha pai com mais grana que eu, com mais tempo que eu, com mais humor do que eu com mais dedicação e coerência do que eu.
de superbacana caí alguns postos até entender que deveria me tornar um superconformado e fazer o melhor mas sem grandes pretensões de medalhas.
filhos têm uma capacidade monstro de te colocar no lugar, de mostrar todas as merdas que vc fez enquanto queria ser o superbacana ou, pelo menos, aquele superbacana que vc gostaria de acreditar que fosse.
ok, todo mundo se esforça e eu também não vou dar mole aqui. sei que ralei, que dei o melhor de mim mas isso toma um tempo grande. talvez o tempo que deveria estar com a filhota no colo contando uma história ou simplesmente olhando nuvens. talvez isso explique porque muita gente é melhor avô do que pai. o tempo é outro.
lembro quando vi meu pai fazendo cavalinho para uma de minhas filhas. meu pai? aquele lá que eu via estressado e ausente, que nunca lembrava o dia de nosso aniversário?
a vida dá voltas e isso, sim, é superbacana.

este foi o primeiro dia dos pais que minhas filhas passaram longe. longe de verdade, não ausentes. uma está em brasília e outra na argentina.
aí fico pensando em outra coisa: pra que a gente cria filhos?
faz quase dois anos que elas saíram de casa. bateram asa e foram cuidar da vida. são independentes e fortes como são fortes suas asas e aí vc pensa: caramba, isso é que é superbacana!
vc cria filhos para que eles vivam sua vida, para que plantem seus frutos e queiram, eles também, serem superbacanas com independência e bom caráter.
vc faz uma parte. o resto é com eles.

às vezes me pego querendo acreditar que vou ver através das paredes, que ainda vou ficar forte e que voar é uma questão de treino.
acordo com uma das duas, no meio de uma conversa, dizendo que é a terceira vez que tô repetindo o mesmo assunto, como se fosse a primeira.
upa-lelê…

perdi minha chance de ser o superbacana mas sinto orgulho do que elas se tornaram.
mas, calma lá. sem mimimi!
pra bom cavalinho sei que vou servir bem!
de repente, um cavalinho superbacana.

 

 

 

 

 

 

 

Sobre o autor

Orlando Pedroso é artista gráfico e ilustrador, trabalhou com praticamente todas as publicações da grande imprensa. Foi colaborador da Folha de S. Paulo de 1985 a 2011. Ilustrou mais de 60 livros infanto-juvenis e é co-autor de “Livro dos Segundos Socorros” e “Não Vou Dormir” – finalista do prêmio Jabuti de 2007 nas categorias “ilustração” e “melhor livro”. Foi vencedor do Prêmio HQ Mix de melhor ilustrador nos anos de 2001, 2005 e 2006. Expôs nas mostras individuais como “Como o Diabo Gosta”(1997) , “Olha o Passarinho!”(2001), “Uns Desenhos” e “Ôtros Desenhos” (2007). Em 2008, faz uma exposição retrospectiva de 30 anos de trabalho como artista convidado do 35º Salão de Humor de Piracicaba.- É autor dos livros Moças Finas, Árvres e do infantil Vida Simples, e membro do conselho da SIB – Sociedade dos Ilustradores do Brasil.

Sobre o blog

Este blog trata de artes gráficas, ilustração, cartum, quadrinhos e assuntos aleatórios.

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