revista as periquitas reúne produção feminina em desenhos e textos
maria claudia frança nogueira, a cartunista crau da ilha nasceu em 1956 mas é cria, de fato, do "grilo", "balão" e "pasquim" publicados no início dos anos 70. depois, colaborou com "o bicho", editado pelo fortuna, fazendo cartuns, textos e ajudando na produção.
em 1977 foi morar em ilhabela, litoral de são paulo, e trabalhou com várias publicações como imprensa livre, jornal da ilha e diário do litoral norte, entre outras.
foi funcionária pública, fez ativismo ambiental, escreveu 3 livros, trabalhou num projeto de resgate do samba caiçara.
hoje, morando em florianópolis, estuda engenharia de aquicultura e tem um taxi.
com a facilidade da internet conseguiu encontrar antigas parceiras e retomar a idéia de uma publicação que reunisse a produção de mulheres cartunistas, ilustradoras, quadrinistas, escritoras.
nasce, assim, com o apoio da pesquisadora cris merlo e do editor franco de rosa, a revista as periquitas.
mariza dias costa, ciça alves pinto, claudia kfouri, natalia forcat, germana viana e lorena kaz (que assina uma das duas capas) são algumas das integrantes. há, também, a participação da tatuadora carla rissatto e uma longa entrevista com laerte.
abaixo, entrevista com crau:
blogdoorlando – como surgiu a idéia de uma publicação só com mulheres?
Crau – Foi ainda no milênio passado quando reencontrei pessoas do meio, o Gualberto e o JAL. Eu havia passado um longo tempo atuando em outras áreas e, eventualmente, desenhando mas fora dos grandes centros. Gualberto, alegando que quase não havia cartunistas mulheres, provocou: – Por que será que as mulheres começam a fazer mas não persistem no cartum? Respondi: Pois, agora, estou pensando em fazer uma revista de mulheres cartunistas. Ele e o JAL adoraram a idéia e logo me passaram o contato de dezenas de meninas que estariam fazendo cartum e quadrinhos. Era o início dos anos 90 e poucas pessoas usavam o computador, muito menos a Internet. Escrevi cartas para quarenta mulheres que, ou desenhavam, ou faziam roteiros, ou criavam histórias completas ou cartuns, de que fui tendo notícia, pelo Brasil afora. E elas chegaram a me mandar trabalhos. Foi o primeiro movimento nesse sentido, mas como eu morava no mato e não tinha estrutura alguma para produzir uma revista, o projeto ficou incubado no ninho.
blogdoorlando – e como a revista foi viabilizada?
Crau – No ano 2000, envolvida em outro projeto de vida, de música, entreguei de presente a idéia da revista com a sugestão de nome "A Periquita" para que a pesquisadora de quadrinhos Cristina Merlo fizesse acontecer. No ano passado a Cris me reencontrou e disse que havia um editor interessado em produzir a revista e os dois me intimaram a editá-la. Era o Franco de Rosa que, aliás, tem como sobrenome um nome de mulher. Como já é outro tempo e A PERIQUITA deu cria, agora somos AS PERIQUITAS.
blogdoorlando – há muitas mulheres ilustrando mas poucas se dedicando ao cartum. por que?
Crau – Quando fazíamos OBicho com o Fortuna, no Rio dos anos 70, havia algumas cartunistas tentando trabalhar. Naquela época eu conhecia pelo menos três que faziam algum tipo de humor gráfico: a Ciça n'A Folha, a Mariza (OBicho, O Pasquim), a Patrícia Mendonça (na Crás) além de mim, que apenas iniciava n'OBicho. Se havia essas atuando, imagino que houvesse outras, ocultas ou até mesmo envergonhadas de se apresentarem diante da profusão produtiva e visível dos talentos masculinos. Mas desde a caricaturista Rian (1886-1981), o desenho de humor deixou de ser exercido exclusivamente por homens.
Talvez o tempo de criação das mulheres seja um pouco diferente da dos homens e isto nos torne invisíveis.
Desde que convidei as meninas para esse mesmo projeto no século passado, criamos quadrinhos, cartuns e outras obras, além de cabelos brancos, filhos e netos. Algumas cresceram na profissão, outras decolaram, mas continuam a dizer que "não há mulheres cartunistas".
Reflito se nosso próprio senso de humor se manifeste de diferentes maneiras e possa às vezes não ser reconhecido. Mas não gosto de limitar o conceito "cartunista" somente para quem faz piadas desenhadas, mas estendê-lo para quem interpreta o mundo mediante mensagens gráficas, seja em forma de narrativa nas histórias em quadrinhos, seja pela visão crítica do desenho de humor, como faz Mariza.
blogdoorlando – como foram escolhidas as participantes?
Crau – Lembrei da Mariza, da Ciça, da Thaís Linhares, da Natália Forcat, a quem já havia convidado na edição da Primeira Periquita. Chamei também outras amigas de quem respeito o trabalho como a Ana Viegas, que considero uma plena humorista do traço que nem sabia que era. Ela me indicou a Luiza Nasser e a Claudia Kfouri. O Franco trouxe e citou mais algumas que fiquei caçando na Internet e assim foram chegando a Lorena, a Alessandra Mattos, a Dadí, a Maria Rita, as argentinas e todas as demais. Como o critério principal era "ter algo a dizer", descobri uma sobrinha de dez anos, a Bibi, que sabia fazer roteiros bem engraçados e resolveu desenhar.
Nesse período de chocadeira das Periquitas (levou um ano) fiquei feliz ao constatar que aconteceu pelo menos uma edição de revista, "Mulherada", com cartuns de mulheres trabalhando exclusivamente o tema "gênero", e que a Folha abriu um espaço exclusivo para tiras feitas por mulheres, o que parece ter levantado um pouco o manto da invisibilidade. Só para deixar dito, As Periquitas não têm as questões de gênero como tema exclusivo, embora neste número isso tenha aflorado em diversas páginas.
blogdoorlando – o laerte concedeu uma grande entrevista, não?
Crau – Sim. Grande, em tamanho e uma histórica entrevista. Foi um papo delicioso entre comadres em que muitos paradigmas foram expostos e questionados, que durou mais de três horas e foi um "isso" para transcrever. Laerte, além de ser uma referência no cartum, sempre foi ativista de causas político-sociais e não podia deixar de estar presente, já que se propôs a se encarnar em mulher. Já como precursor de Arlete, personagem consultora sobre assuntos polêmicos, forneceu uma perspectiva histórica do feminismo e sobre a presença da mulher no cartum.
blogdoorlando – a revista vai ser distribuída onde? onde ela poderá ser encontrada?
Crau – A revista vai ser distribuída em bancas, juntamente com a Caros Amigos e poderá ser encontrada em algumas livrarias ou encomendada pela internet.
Deverá estar nas bancas a partir do dia 15.
Serão feitos diversos eventos de lançamento em algumas capitais e outras cidades como Florianópolis, Curitiba, Ilhabela, Santos e não sei mais onde.
Serviço:
As Periquitas
Data: 29 de outubro
Horário: das 19h às 21h30
Local: Casa das Rosas – Espaço da Palavra
Endereço: Av. Paulista, 37
Editorial Kalaco
96 páginas
Capa dupla com slip
Formato 20,5 x 27,5 cm
Preço de Capa: R$ 39,90
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