Topo

Histórico

Categorias

ainda sobre imprensa, desenho, leitores e um futuro incerto

Orlando

24/10/2016 16h58

Desenhista de jornal 72

 

tem gente que não se conforma com a defesa ao jornalismo e, em especial, ao jornalismo impresso.
enquanto as publicações brasileiras entregam os pontos, editores americanos e europeus anunciam novos projetos para seus jornais e revistas.
(só para fazer um paralelo com outro ramo editorial, em 2015 foram vendidos mais livros de papel do que e-books o que mostra que o digital pode ser prático, conveniente, mas ainda vai ter que comer muito feijão para se firmar como única alternativa de leitura.)
nas últimas semanas temos visto uma série de reportagens com editores e jornalistas americanos defendendo novas ideias para que o desalento seja defenestrado das redações.
para citar dois exemplos recentes, walter robinson, 70, que chefiou a equipe de reportagens de spotlight sobre abusos sexuais de padres em boston e a coluna da ombudsman da folha, paula cesarino, que fala sobre a mudança de projetos do wall street journal além de citar o el país e o the new york times.
walter robinson, em visita ao brasil, reafirmou que 'o jornal continua a ser a principal fonte confiável'. num mundo repleto de interesses corporativos e políticos, quem vigia o vigia? sempre haverá conflitos mas sempre haverá quem pega no pé. num mundo repleto de colunistas e blogueiros, quem pode arcar com o investimento de reportagens de fundo que tomam meses de pesquisas, viagens, entrevistas, confirmações? somente grandes jornais e grandes revistas.
por isso, jornais como o wall street journal, o maior jornal dos eua com 2,3 milhões de exemplares, devem acreditar que seus bons jornalistas merecem uma estrutura decente para produzirem furos e trazerem ao leitor algo mais do que o achismo dos palpiteiros dos dias atuais.
sem dúvida, como em qualquer atividade, existem profissionais prontos para encarar o desafio de fazer suas profissões grandes de novo.
talvez esta seja a única possibilidade de salvação da imprensa.

TV E JORNAL
se olharmos a tv, percebemos que programas como tá no ar e zorra, só para ficar nos humorísticos, conseguem provar que o público chamado povão entende piadas mais sofisticadas, não sente falta de bordões e, pasmem, continua fiel ao canal e ao horário.
apostar num conteúdo raso achando que só assim o público vai entender, é um tiro no pé.
isso vale também para o jornalismo e o que ele está conseguindo é o emburrecimento das redações.
aí, não tem santo que ajude.

DESENHISTAS
e o que os artistas gráficos têm a ver com isso?
tudo.
na medicina temos pesquisadores, pediatras, ginecos, neuros, ortopedistas ou a linha de frente dos pronto-socorros.
nas artes gráficas, é o mesmo. temos pesquisadores, cartunistas, chargistas, ilustradores técnicos, ilustradores 3d, ilustradores de livros infantis, quadrinistas, cada um com sua especialidade (mesmo que elas andem em paralelo, às vezes) e cada um com seu tempo. ilustradores de livro e quadrinistas podem levar meses para finalizar um trabalho, por exemplo.
mas tem um outro, que pode ser considerado o médico da emergência, que é o desenhista de jornal.
e não adianta dizer a ele que os tempos mudaram e que ele tem que se reinventar.
o desenhista de jornal quer urgência, só funciona se o trabalho for para ontem. se for para antes de ontem, melhor ainda!
o desenhista de jornal precisa ter uma ideia antes de terminar de ler a notícia. passa merthiolate, sutura, enrola a gase, libera o paciente e corre para a porta de saída do hospital para ver se o paciente já sarou.
o desenhista de jornal faz hora no bar para passar numa banca e dar uma espiada no seu desenho impresso antes de ir pra casa dormir.

por isso, desenhistas de jornal não querem que as publicações acabem. por isso eles ficam acenando para editores que usam óculos escuros, têm cara de tédio e colocam artistas plásticos para tapar aqueles buraquinhos das páginas. para que tenham sua natureza e espaço vital preservados.
nesse amor mal correspondido perde principalmente o (não)leitor, que não consegue se reconhecer nas páginas das publicações e que tem só metade da história contada.
reinventar o jornal talvez seja só fazer jornal com cara de jornal.

Salvar

Salvar

Salvar

Sobre o autor

Orlando Pedroso é artista gráfico e ilustrador, trabalhou com praticamente todas as publicações da grande imprensa. Foi colaborador da Folha de S. Paulo de 1985 a 2011. Ilustrou mais de 60 livros infanto-juvenis e é co-autor de “Livro dos Segundos Socorros” e “Não Vou Dormir” – finalista do prêmio Jabuti de 2007 nas categorias “ilustração” e “melhor livro”. Foi vencedor do Prêmio HQ Mix de melhor ilustrador nos anos de 2001, 2005 e 2006. Expôs nas mostras individuais como “Como o Diabo Gosta”(1997) , “Olha o Passarinho!”(2001), “Uns Desenhos” e “Ôtros Desenhos” (2007). Em 2008, faz uma exposição retrospectiva de 30 anos de trabalho como artista convidado do 35º Salão de Humor de Piracicaba.- É autor dos livros Moças Finas, Árvres e do infantil Vida Simples, e membro do conselho da SIB – Sociedade dos Ilustradores do Brasil.

Sobre o blog

Este blog trata de artes gráficas, ilustração, cartum, quadrinhos e assuntos aleatórios.

Blog do Orlando