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sétima economia, festa de primeira, futebol de segunda, penteados de quinta

Orlando

14/07/2014 11h42

Barbeiro 72

um lance de sorte ou um vacilo pontual pode decidir uma partida.
o jovem atacante mario götze, num raro lampejo, matou a bola no peito e estufou a rede argentina dando a vitória à seleção tedesca.
equilibradíssima, o jogo caminhava para a disputa nos penaltis.
é verdade que a argentina pressionou mais, teve mais chances mas o futebol não foi inventado para ser justo. há uma enormidade de variantes que podem influir no resultado.
são pelo menos 22 jogadores em campo, há o juiz, os bandeirinhas, os técnicos, o gramado, o calor, a chuva, a torcida.
cada um desse itens pode influenciar no resultado final.

mas há outro ponto: o preparo.
o brasil fez a copa daquele jeito que vimos e acabou por dar certo. quer dizer, o básico que tinha que funcionar, funcionou.
além disso, fez o que sabe fazer de melhor: festa.
talvez nenhum outro país tenha a competência de improvisar tanto e mesmo assim impressionar seus visitantes.
é claro que o turista chega aqui aberto à caliência latina e, nesse ponto, entregamos o que vendemos.
foram 31 dias de pleno carnaval e quem veio se fartou.

resta agora o outro balanço, aquele mais difícil. fazer contas, terminar obras, varrer a sujeira e repensar como o país realiza seu projeto.
felipão era uma unanimidade. a escalação também. tínhamos tudo para dar certo menos um meio de campo e times que fizessem corpo mole.
a fase de grupos foi eletrizante.
os esquadrões colocaram toda sua energia na tentativa de classificação e ofereceram jogos com um grau de adrenalina incomum em nossos tempos tão racionais.
uruguai e inglaterra é um jogo que qualquer profissional da bola deveria assistir duas vezes ao dia até a próxima copa.
garra, técnica, tática, lealdade.
mas o futebol não foi inventado para ser justo e os dois foram para casa.
aliás, se fosse justo, sobrariam holanda e alemanha na final.
a argentina fez uma campanha arrastada e sem brilho mas deu sorte.
na final, botou as garras de fora e quase entornou o chucrute dos alemães.
são argentinos.

agora, procura-se os culpados como se culpados houvesse.
existem, isto sim, responsáveis. existem aqueles que ainda acreditam que conseguem fazer tudo na base do improviso.

estamos há um ano e meio das olimpíadas no rio.
como sempre, as obras estão atrasadas. vão ficar prontas? provavelmente.
mas daquele jeito, na correria, no super-faturamento, sem licitação, morrendo um operário aqui e outro ali.
enquanto isso, nossos atletas continuam treinando descalços e nossos medalhistas correndo atrás de patrocínio.
não há uma notícia de que nesse tempo todo governo e empresas tenham criado escolas e polos de formação de novos atletas.
corremos o risco de continuarmos com aquele número minguado de medalhas e muitas matérias de superação nos jornais de esportes.

se houve uma insatisfação generalizada antes da copa, parece que foi por ter ficado tão claro o como as coisas são feitas no brasil.
acabou a água de são paulo. é verdade que a estiagem é gigante mas também é verdade que não existem investimentos nessa área há décadas.
escolas e hospitais esperam por um dinheiro que vai ficando pelo meio do caminho absorvido pela burocracia e corrupção da máquina.
dinheiro há mas ele não chega ao destino.

hora de repensar o país, hora de pensar em como exigir mais daqueles que pedem nossos votos, hora de se fazer um novo projeto de nação e isso pode ser bem difícil e doloroso.
a outra opção é continuar a fazer festa e continuar inovando nos penteados.
festa sabemos fazer bem, penteados nem tanto.

 

 

 

 

 

 

 

Sobre o autor

Orlando Pedroso é artista gráfico e ilustrador, trabalhou com praticamente todas as publicações da grande imprensa. Foi colaborador da Folha de S. Paulo de 1985 a 2011. Ilustrou mais de 60 livros infanto-juvenis e é co-autor de “Livro dos Segundos Socorros” e “Não Vou Dormir” – finalista do prêmio Jabuti de 2007 nas categorias “ilustração” e “melhor livro”. Foi vencedor do Prêmio HQ Mix de melhor ilustrador nos anos de 2001, 2005 e 2006. Expôs nas mostras individuais como “Como o Diabo Gosta”(1997) , “Olha o Passarinho!”(2001), “Uns Desenhos” e “Ôtros Desenhos” (2007). Em 2008, faz uma exposição retrospectiva de 30 anos de trabalho como artista convidado do 35º Salão de Humor de Piracicaba.- É autor dos livros Moças Finas, Árvres e do infantil Vida Simples, e membro do conselho da SIB – Sociedade dos Ilustradores do Brasil.

Sobre o blog

Este blog trata de artes gráficas, ilustração, cartum, quadrinhos e assuntos aleatórios.

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